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(…) Sentença Relativa ao commercio das especiairias.
Dom Manoel por
graça de Deos Rei de Portugal, e dos Algarves, dáquem, e dalém
mar, em Africa Senhor de Guiné, e da Conquista, Navegação,
Commercio de Ethiopia, Arabia, Persia, e da India. A todolos
Corregedores, Juizes, e Justiças, Officiaes, e Pessoas de nossos
Reinos, e Senhorios, a que esta nossa Carta de Sentença for
mostrada, e o conhecimento della pertencer, saude. Sabede, que
perante nós em nossa Corte se tratou um feito entre partes, s. c. Os
Corretores desta nossa Cidade de Lisboa como Authores de huma parte
contra o Procurador dos nossos Feitos como Reo da outra; o qual feito
era sobre, e por razão, que se devião levar os ditos Corretores
corretage das compras, e vendas, que se na dita Cidade fazião antre
naturaes, e estrangeiros da especiaria, drogoaria, e cousas que
vinhão da India, &c. em o qual feito foi oferecido por parte dos
ditos Corretores hum Libello, e muitas Escripturas, e Posturas da
dita Cidade, e verbas de livros de corretages &c. Sobre o qual
Libello foi tanto arrezoado de huma, e outra parte, que o feito foi
perante nós concluso, e visto por nós em Relação com os do nosso
Desembargo acordamos, que nom recebiamos o dito Libello dos ditos
Corretores contra o nosso Procurador, e mandaramos que elles Authores
nom levassem corretage da especiaria, e drogaria, que fosse vendida
na Casa da India pelos nossos Officiaes; e quanto ás ditas
mercadorias, que fossem vendidas pelas partes fóra da dita casa, e
nom pelos ditos nossos Offi-[152]ciaes, lhe ficasse seu direito
resguardado, se entendessem que o tinhão conta as pessoas, que a
dita mercadoria fóra da dita casa vendessem, e comprassem, e que
fosse sem custas. E dada assi a dita determinação no dito caso, e
duvida, como dito era: por parte dos ditos Corretores nos foi pedido,
que determinassemos logo pelos ditos autos se havião elles Authores
de levar corretage da especiaria, e drogoaria das pessoas que a
comprassem, ou vendessem fóra da dita Casa da India. E visto por nós
sua petição, antes d’outro livramento, mandaramos que fosse
notheficado aos Vereadores, e Officiaes da dita Cidade o contheudo na
dita petição dos Corretores, os quaes inviassem dizer se tinhão
algum embargo aos ditos Corretores levarem corretage da dita
especiaria, e drogoaria, que se vendesse fóra da dita Casa da India
por elles Corretores, e sobre todo inviassem allegar de sua justiça,
e bem assi fosse posto Alvará de notheficação, e editos á porta
d’Alfandega da dita Cidade, porque fosse notheficado todolos
Mercadores, e pessoas a que o caso tocasse, que dentre de oito dias
viessem, ou inviassem allegar de sua justiça sobre o dito caso, ao
qual nosso mandado foi satisfeito, e o dito Alvará de editos foi
posto, e pregado nas portas da dita Alfandega, e assi foram
requeridos os ditos Vereadores, e Officiaes da Camara desta dita
Cidade, os quaes inviarão sua procuração, e fiserão seu
procurador; e assi parecerão perante nós certos Mercadores a que o
caso tocava. E outrosi fiserão seu procurador para allegar de sua
justiça, os quaes todos foram ouvidos com o procurador dos ditos
Corretores, e allegarão de seu direito, e o dito feito com o que
disserão, e allegarão fora outra vez perante nos concluso, o qual
visto por nós com aquelles nossos Desembargadores, a que a dita
duvida mandaramos ver com hum parece com o nosso passe, e a petição
dos ditos Corretores determinaramos, o que os ditos Corretores devião
levar e haver a corretage, segundo a Postura da Cidade de toda a
especiaria, e drogoaria, e cousas que vinham da India, que se
vendesse, e comprassem antre partes fóra da nossa Casa da India, que
fossem vendidas, e compradas por elles Corretores, e em seus livros
assentados, e assignados pelas partes e esto quando alguma das
partes, que assi comprasse, ou vendesse fosse estrangeiro; e se o
comprador, e vendedor fossem ambos naturaes, e moradores do Reino,
nom levarião a dita corretage da dita especiaria, e drogoaria, e
cousas que viessem da India, &c. do qual parece, e passe os ditos
Corretores tirarão sentença, e a passarão por nossa Chancelaria. E
despois de assi passada, vierão com huma petição, dizendo nella
como por Posturas, e Ordenança desta dita Cidade os estrangeiros nom
podessem fazer compras, nem vendas de cousa alguma, senom por elles,
e isto sob grandes penas contheudas nas ditas Posturas, e por ello
pelo Chanceler mór, e Lecenciado Rui da Graã, e Doutor João
Cotrim, a que nós mandaramos ver, e despachar o caso, fora
determinado com nosso passe, que os ditos estrangeiros, segundo as
ditas Posturas, e Ordenanças, lhes pagassem seus direitos de
especiaria, e drogoaria vendida fóra da Casa da India, que por elles
fosse vendida, e comprada e assentada em seus livros assignados por
as partes, e por a dita verba posta na dita sentença, e
determinação, s. c: em quanto dizia que seja assentado nos livros,
e assignado pelas partes fazer a dita determinação duvidosa, os
ditos estrangeiros em fraude das ditas Posturas, e Ordenanças, e
seus direitos, hião fazer suas compras, e vendas escondidamente
delles com quem querião sem cousa alguma quererem fazer com elles
como eram obrigados, assi que por a dita determinação em algumas
maneira estar confusa perdião seus Officios, e direitos, e os ditos
estrangeiros tomavão caminho para fazerem o que nom devião:
pedindo-nos que mandassemos aos sobreditos, a que [153] mandaramos
ver, e despachar, o caso, que declarassem a dita determinação de
maneira, que nom podesse nella mais haver duvida, nem diferença
alguma segundo todo esto, e outras cousas mais cumpridamente erão
contheudas na dita petição, a qual vista por nós em Relação com
os do nosso Desembargo, acordámos, que se ajuntasse ao feito, e
fosse notheficado aos ditos Vereadores, e Officiaes da dita Cidade o
contheudo na dita petição para mandarem requerer sua justiça, e
bem assi fosse notheficado a todolos mercadores, e pessoas a que o
caso tocasse por Alvará de Editos, o qual seria posto á porta
d’Alfandega, que a seis dias primeiros seguintes viessem, ou
mandassem requerer sua justiça &c. Ao qual nosso mandado foi em
todo satisfeito, e foi de todo dado vista ás partes, por os quaes
foi em dito feito tanto arrezoado do direito de cada huma, que foi
perante nós finalmente concluso; o qual visto por nós em Relação
com os do nosso Desembargo, acordámos, que visto o parece, que no
dito feito havia, porque foi determminado, que os Corretores da dita
Cidade de Lisboa levassem corretage dos estrangeiros, segundo a
Postura da dita Cidade, de toda a especiaria, e drogaria, e cousas
que vem da India, que elles estrangeiros comprarem, e venderem por
Corretores fóra da Casa da India; e como pela dita Postura he
determinado, que os estrangeiros fação suas compras, e vendas com o
Corretor; e não as fazendo com Corretores, que todavia paguem a
corretage aos ditos Corretores, o que nom foi determinado no dito
parece, e determinação, mandamos, e declaramos, que a dita Postura
se cumpra, e guarde em as ditas mercadorias de especiaria, e
drogoaria, e cousas que vem da India, sem que os ditos estrangeiros
fação as ditas compras e vendas da dita especiaria, e drogaria, e
cousas que vem da India sem Corretor; por quanto se a dita Postura se
assi nom cumprisse, o dito parece, e despacho, nom haveria efeito,
todo o estrangeiro faria suas compras, e vendas das ditas mercadorias
sem Corretor, o qual parece, e esta declaração se nom entenderão
nas ditas mercadorias quando forem vendidas, ou compradas pelos
nossos Officiaes em nosso nome; por quanto quando assi forem
compradas, e vendidas pelos nossos Officiaes em nosso nome, os ditos
Corretores nom Farão as taes vendas, e compras, nem levarão
corretage. E porém vos mandamos, que assi cumprais, e guardeis, e
façais cumprir, e guardar como por nós he determinado, e al nom
façades. Dada em a nossa Cidade de Lisboa a quatro dias do mez de
Maio. El Rei o mandou pelo Corregedor João Cotrim do seu Desembargo,
e Corregedor de sua Corte dos Feitos Civeis, a que o dito caso mandou
livrar &c. Antonio Gomes a fez. Pedro da Mata tem o feito anno do
Nascimento de Nosso Senhor Jezuz Christo de mil quinhentos e quatorze
annos. Pagou trezentos reis, e de assignatura cem reis.1
1-Systema de
Regimentos. T. V, p. 573 e seg.
Sentença 04 de maio
de 1514, Boletim do Conselho Ultramarino, Legislação Antiga, Volume
I, 1446 a 1754, Editor: Imprensa Nacional, Local de Edição:Lisboa,
Data de Edição:1867-1869, pp.151-153, site.
Transcrito por Rodrigo Sérgio Meirelles Marchini. Para confrontar a transcrição com a fonte clique aqui.